POR FLORA PFEIFER – As ASICS Golden Runs deste ano foram marcadas por uma nova experiência para mim: correr no pelotão de Elite. Para entrar neste grupo, em geral presente nas corridas envolvendo premiação em dinheiro, você deve ter um registro ativo da CBAT (federação de atletismo) e ter feito provas recentes, obedecendo o recorte de tempo exposto no regulamento da competição. Eis que este ano eu tinha os critérios para me inscrever e fui aceita neste seleto grupo.
Sou uma atleta amadora e olho com muita admiração para as profissionais de atletismo. Largar ao lado delas e tentar acompanhá-las me traz a sensação de me aproximar do cerne do esporte. Eu lembro dos meus tempos no atletismo universitário, quando olhava para meus tempos – suficientes para encabeçar competições da faculdade – em comparação com de profissionais com um grande abismo, quase como se estivessem em um mundo à parte, inacessível. Ainda olho dessa forma, mas digamos que um pouquinho mais próximas. Como se estivesse construindo uma ponte, que ainda tem pouca estrutura e é bem bamba, mas está se formando. A corrida de longa distância é o ato de se pensar no futuro e se estar no futuro, e a projeção que fazemos dele determina nossos resultados.
Na primeira ASICS Golden Run do ano, em São Paulo, minha principal empolgação era justamente essa: a largada. Ao retirar meu kit e pela primeira vez receber os números de peito escritos “elite”, com direito a ter um para a frente e outro pelas costas, minhas lágrimas encheram de emoção. Ao meu lado, estavam atletas que via na TV no Troféu Brasil e nos campeonatos internacionais. Ombro a ombro nos posicionamos para a pistola da largada, e naquele momento (apenas naquele, pois depois rapidamente fiquei pra trás rs) estávamos lado a lado. Corri a maior parte do tempo sozinha, finalizando com a marca de 43:23.
Na segunda prova, no Rio, tinha um plano mais ambicioso: tentar largar com o grupo e ver até onde aguentava, buscando a melhora do meu recorde pessoal. Bom, não durou muito além de 500 metros para elas abrirem, mas me mantive focada e fiz minha melhor corrida do ano. Me senti leve e fluída; não precisei de água, gel ou relógio, e cravei os 43:03. Ainda distante do meu recorde pessoal (42:31) mas envolta na sensação de evolução do ciclo, com olho na próxima prova. Mas me surpreendi quando, na hora da largada, apareceram apenas 5 atletas. Isso quer dizer que teria um pódio garantido – e então o impensável aconteceu: não só larguei, como fui premiada na categoria da Elite! Pois é galera, com direito a cheque grandão e tudo!! (e não, o talão gigante não fica com você de recordação, apesar de eu quase ter saído do palco levando ele).
Enquanto a gente esperava as atletas sorteadas voltarem do exame de doping para subir no pódio, aproveitei para conversar com as outras ganhadoras sobre o atletismo. Perguntei qual a maior lição que elas tinham tido nesse esporte, aquilo que mais as tinham feito melhorar. Sempre gosto de ouvir o que os atletas têm a me dizer, em geral são algumas das conversas mais interessantes que tenho.
“Lidar com a frustração. Mas não só na corrida; mais no sentido de o quanto a corrida fez a gente aprender pras outras coisas da vida”
A outra concordou e complementou:
“Total. Você se frustra toda hora nesse esporte. No treino, nas provas. Até que do nada, quando você não espera, vem um resultado bom. Mas esses momentos são raros”
“Só que você já fica treinada a lidar com isso, e aí quando algo acontece na sua vida fora do esporte você também sabe lidar melhor.”Ouvir isso de pessoas que, para mim, só experienciariam conquistas – afinal, para mim, elas atingiram o tempo inacessível, chegam com frequência no pódio e colhem as glórias do esporte – foi como uma chavinha virando. Esse tempo todo pensava em como lidar com a corrida apesar das frustrações. Me acostumando a superar a frustração, com o olho no dia que a conquista viria. Mas, pelo jeito, disfarçada de algo negativo a ponto de tanta gente não perceber, e alguns até fugirem disso buscando sempre “novos desafios”, essa é, justamente, a mais valiosa preciosidade que a corrida tem a nos tem a trazer. Correr pela Elite pode até ter me trazido o gostinho da glória de receber uma premiação, ou quem sabe eventualmente virá a me trazer meu melhor tempo, mas sou grata especialmente pelos aprendizados que isso me traz ao frequentar o mesmo espaço de quem tem a maestria nessa arte que tanto valorizo.
SOBRE A AUTORA
FLORA PFEIFER – Cientista comportamental e corredora há 10 anos, utilizo a corrida como metodologia de criação e plataforma de descobertas sobre o comportamento humano. Embaixadora ASICS FrontRunner, em defesa de uma mente sã em corpo são.