Ultramaratona dos Perdidos 2017: do sonho à realidade

POR THIAGO TOZZI – Minha expectativa estava muito grande, afinal, no ano passado a prova foi cancelada no 6º km, devido à chuva que comprometia a segurança da prova.

De lá para cá, tive uma lesão que me deixou parado por 6 meses, e resolvi não disputar prova nenhuma, me dedicando exclusivamente para os Perdidos.

Às 6h da manhã foi dada a largada dos 45 km. O frio era de 14 graus, mas a sensação era estar muito mais frio, além disso, os 5800 m de desnível total iriam exigir muito preparo.

Comecei a prova em um ritmo bem cadenciado. Fiz o 1º Morro dos Perdidos em 1h07min, na descida apertei um pouco e alcancei um grupo que estava próximo ao pelotão intermediário. No 1º AID Station acabei nem parando, pois ainda tinha bastante água e dava para encher apenas no 2º AID. Acompanhei esse pelotão intermediário até por volta do 15º km, onde após alguns aclives mais fortes, resolvi segurar um pouco, pois tinha muita prova para acontecer ainda.

No 19º km veio minha grande surpresa, sinto uma câimbra na coxa esquerda e ao firmar o pé direito no chão para aliviar a perna esquerda, sinto uma câimbra mais forte na coxa direita. Mil pensamentos vieram na minha cabeça em segundos. Nunca havia tido câimbra em corrida alguma. Não sabia se era grave; respirei fundo, apoiei na árvore que estava ao meu lado, e alonguei até a dor passar. Pensei comigo mesmo: ok, daqui 2 km tem o 2º AID Station, lá como e bebo alguma coisa com calma, alongo novamente e sigo a prova.

Chegando no AID 2#, bebi um copo de refrigerante e uma lata de energético, comi uma barrinha e coloquei mais duas na mochila. Completei minhas águas, alonguei, tirei o corta vento e segui para o AID 3# no 26º km. Estes 5km foram feitos em 1h05min, algumas câimbras voltaram a incomodar um pouco, mas segui firme mesmo com a perna já um pouco pesada.

No AID 3# bebi um refrigerante, enchi minhas águas, coloquei mais 2 barrinhas na mochila e segui junto com outro corredor para a parte mais difícil da prova: subir o imponente e lindo Morro do Araçatuba, com 1659m. Consegui correr 1km junto do outro corredor e senti uma fisgada forte nas 2 coxas novamente. Parei e respirei. Ele me ofereceu ajuda, mas pedi que continuasse a prova e não se preocupasse, pois já vinha fazendo isso desde o 19ºkm. Ajoelhei no chão para alongar a coxa, sentando em cima dos meus pés. Nesse momento, a câimbra aumentou em uma intensidade tão grande a ponto de me fazer chorar de tanta dor, parecia que uma faca estava rasgando minha coxa de cima a baixo.

Nesse momento, vemos o quanto a cabeça da gente tem poder. Novamente, um turbilhão de pensamentos: pensei em todos os treinos, em quanto me dediquei para fazer a prova e em todas as pessoas que fizeram parte disso e estavam torcendo por mim para que eu a completasse. Respirei fundo, alonguei até que a câimbra melhorasse, levantei e segui rumo ao Araçatuba. O 29º e o 30ºkm foram tão difíceis que completei em 45min e 20seg. Finalmente, após muita subida e ventos fortes, cheguei no cume do Araçatuba com uma grande sensação de alivio, pois sabia que ali já havia passado pela parte mais difícil da prova, apesar de ainda ter muito chão pela frente. Comecei a minha descida, passei algumas pessoas, fiz a parte da descida muito bem e não via a hora de chegar na próxima e última AID Station, pois estava com pouca água e a sede aumentava a passos largos já que estava no 37ºkm. No 39ºkm, minha água acabou e, para minha sorte, no 40º havia um rio e 2 pessoas do Staff, um com uma jarra para lavar a mão e o rosto de quem quisesse e outro com água. Não tive a menor dúvida, bebi um pouco de água e fui rumo ao último AID 4#.

Lá, tomei 3 copos de refrigerante, enchi minhas águas e segui rumo aos 4kms finais. Uma parte bem pesada da prova, com muito sobe e desce em mata fechada, raízes pelo chão e vários trechos com lama, onde o pé afundava até a canela. As câimbras apareciam muito nesse final e as pernas já estavam bem pesadas.

Já havia passado 8h30min de prova, no 43ºkm me veio um estalo de que não poderia ultrapassar as 9h de prova.

Comecei a aumentar um pouco o ritmo e finalmente cheguei na estrada de terra que levava ao Pórtico. Ali, o chão era batido, plano, minha câimbra não iria mais voltar. Passei 2 pessoas nesse trecho, até cruzar a linha de chegada com 8h53min52seg. Nesse momento, foi como se tivesse revivido todas as emoções e pensamentos que tive durante os momentos mais difíceis da prova, relembrei o gesto das pessoas ao me oferecerem ajuda ao longo do percurso, nas paisagens que tive a oportunidade de ver, e tive a certeza de que todo o esforço valeu a pena. Termino com a sensação de que fiz o meu melhor e ainda mais motivado em busca do próximo desafio.

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